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Prostituição dos professores no ensino à distância

Quem lucra, quem perde e o que está em jogo na educação superior brasileira

03/05/2025 às 18h54 Atualizada em 03/05/2025 às 19h49
Por: Rede Geração
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Prostituição dos professores no ensino à distância

Nos últimos anos, o avanço do Ensino a Distância (EAD) transformou radicalmente o cenário da educação superior no Brasil. O que antes era visto como uma ferramenta de democratização do ensino passou a representar, para muitos professores, um símbolo de precarização do trabalho docente. Enquanto donos de faculdades privadas acumulam lucros milionários, educadores denunciam perdas salariais, sobrecarga e perda de qualidade na formação acadêmica dos alunos.

Muitos alunos, um salário

Antes do modelo EAD se consolidar, um professor universitário atendia uma média de 30 a 40 alunos em sala de aula, com tempo e estrutura para preparar conteúdo, avaliar de forma criteriosa e acompanhar o desenvolvimento de seus estudantes. Hoje, com o ensino online massificado, esse mesmo professor pode ser responsável por turmas com centenas – ou até milhares – de alunos, recebendo o mesmo salário ou, em muitos casos, menos.

A precarização não para por aí. As aulas são frequentemente gravadas e reutilizadas por anos, sem que o docente receba qualquer remuneração adicional. A disciplina é usada em diferentes cursos e turmas, durante vários semestres.

De professor a "operário de larga escala"

Com o avanço do modelo industrializado de educação, os cargos tradicionais de professor foram fragmentados. Hoje, as instituições utilizam uma nova nomenclatura para funções distintas: formadores, mediadores e tutores.

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  • Formadores são os responsáveis por gravar videoaulas ou elaborar apostilas e materiais didáticos. Eles recebem, em média, o equivalente ao salário mensal de um professor presencial, mas seu conteúdo é explorado repetidamente, sem royalties, controle de uso ou reconhecimento.

  • Mediadores pouco mediam: sua função se assemelha mais a de um gestor remoto, supervisionando dezenas – às vezes centenas – de alunos simultaneamente, respondendo dúvidas genéricas e garantindo que todos “sigam o fluxo”.

  • Tutores, por sua vez, são encarregados de corrigir provas e atividades com metas rígidas e prazos apertados. Segundo relatos, muitos são pressionados a aceitar trabalhos medianos ou até plagiados para evitar a evasão de alunos, que agora são tratados como "clientes".

Em algumas instituições, professores tutores recebem, em média, R$10 por hora-aula para realizar correções, com metas de 150 a 300 atividades em um período de quatro horas de trabalho na modalidade de teletrabalho, utilizando seus próprios computadores, o que acarreta na depreciação dos equipamentos pessoais.

Fim do CLT e a "prostituição do MEI"

A maioria dos professores da modalidade EAD atua como MEI (Microempreendedor Individual), sem direito a férias, 13º salário ou outros benefícios trabalhistas. Não recebem em feriados e são frequentemente remanejados, devido ao alto índice de desistência dos alunos, o que torna a remuneração instável e, geralmente, menor no final do ano. Em algumas instituições, os pagamentos podem demorar meses para serem efetuados, pois dependem de processos de faturamento.

Professores assinando álibisde crime

O lucro das instituições, a queda da qualidade

Enquanto isso, as faculdades privadas – especialmente os grandes conglomerados de ensino – seguem expandindo seu alcance, com mensalidades acessíveis e baixos custos operacionais. As estruturas físicas foram reduzidas, professores demitidos, e a lógica empresarial tomou conta das decisões pedagógicas. O ensino virou produto, o aluno virou cliente e o professor, uma peça descartável.

A promessa de democratização virou ilusão. O que se vê é a padronização do conhecimento, o empobrecimento do debate acadêmico e a formação de profissionais que muitas vezes não foram desafiados a pensar criticamente durante sua formação.

Outro exmplo é a criação dos cursos tecnólogs: Cursos Tecnólogos: a face oculta da expansão do ensino superior no Brasil - Clique Aqui e leia a reportagem completa

Educação em risco

Essa lógica ameaça não apenas a carreira dos professores, mas o próprio futuro do ensino superior no país. O EAD pode ser, sim, uma ferramenta poderosa de inclusão e inovação. Mas, quando utilizado como forma de baratear custos e ampliar lucros à custa da qualidade, ele se torna um risco.

A educação não pode ser tratada como linha de produção. E, enquanto isso persistir, quem perde é toda a sociedade.

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