Por séculos, a Igreja Católica não só tolerou como também justificou e incentivou a escravidão — especialmente de africanos e indígenas — com base em doutrinas teológicas, interesses políticos e alianças coloniais.
A cumplicidade papal com a escravidão começa de forma institucionalizada no século XV:
Essa bula autorizava o rei de Portugal a "invadir, conquistar, subjugar e escravizar sarracenos, pagãos e outros inimigos de Cristo". Era um aval papal ao início da escravização de africanos no contexto da expansão portuguesa.
Expandia os poderes concedidos anteriormente e dava à coroa portuguesa direitos exclusivos sobre os territórios conquistados na África, incluindo o direito de escravizar seus habitantes.
Concedia à Espanha domínio sobre as terras recém-descobertas da América, legitimando a colonização e, por consequência, a escravização de povos indígenas.
A justificativa para esses atos era teológica: povos não cristãos eram vistos como “infieis” ou “bárbaros”, e escravizá-los era visto como forma de punição ou de "trazê-los à salvação". Isso revelava uma visão eurocêntrica e hierarquizada do mundo, onde a fé cristã era usada como instrumento de poder político e racial.
Entre os séculos XVI e XIX, milhões de africanos foram sequestrados e transportados para as Américas. Muitos eram batizados à força antes de serem vendidos como propriedade. A escravidão era comum em territórios coloniais controlados por países católicos como Portugal, Espanha e França — com pouca ou nenhuma oposição por parte do Vaticano por séculos.
Foi só em 1839, com a encíclica In Supremo Apostolatus, do Papa Gregório XVI, que a escravidão foi oficialmente condenada pelo papado. Mesmo assim, muitos clérigos católicos continuaram a tolerá-la ou praticá-la, especialmente nas Américas.
Mais adiante, o Papa João Paulo II e o Papa Francisco pediram perdão público pelos pecados da Igreja em relação à escravidão e ao colonialismo. Em 2023, o Vaticano repudiou formalmente a chamada Doutrina da Descoberta, base ideológica para a dominação europeia sobre povos indígenas.
A história da Igreja Católica com relação à escravidão não é simples nem redentora. É uma trajetória marcada por omissão, conivência e até incentivo ativo à desumanização de milhões de pessoas. Reconhecer essa verdade é um passo necessário para que instituições religiosas enfrentem seus passados com honestidade — e para que o mundo nunca esqueça os efeitos de quando o poder espiritual se alia à opressão.