Embora a ABNT seja uma norma técnica nacional, cada evento — mesmo dentro de uma mesma área do conhecimento — costuma adotar regras próprias para submissão de trabalhos. Alguns utilizam variações da ABNT, outros exigem formatos estrangeiros como APA, MLA, Chicago ou Vancouver. O resultado disso é um cenário marcado por:
insegurança metodológica (autores ficam sem saber qual padrão seguir);
retrabalho excessivo (refazer a formatação para cada submissão);
desvalorização da normatização científica nacional.
Este fenômeno tem sido documentado em trabalhos de biblioteconomia e ciência da informação, que apontam a existência de descompasso entre normativas nacionais e exigências institucionais locais.
A maioria dos eventos universitários não segue integralmente as normas da ABNT — nem mesmo aqueles realizados em instituições públicas. Muitos promovem manuais próprios, o que, segundo os autores, causa prejuízo à uniformização da produção científica nacional.
Muitos comitês organizadores optam deliberadamente por não utilizar a ABNT, por considerarem o padrão “burocrático” ou “difícil de operacionalizar” em plataformas digitais. Essa percepção leva à preferência por normas internacionais, especialmente em congressos das áreas biomédicas e das ciências sociais aplicadas.
A ABNT foi criada justamente para oferecer unidade metodológica e técnica, essencial à interoperabilidade científica — ou seja, facilitar a circulação e a validação do conhecimento em qualquer instância formal de pesquisa. Contudo, a ausência de uma política de adoção obrigatória e a autonomia excessiva dos comitês organizadores resultam em:
fragmentação normativa;
erros de formatação que afetam a indexação de trabalhos;
e até barreiras à internacionalização, já que trabalhos redigidos de formas híbridas muitas vezes não são aceitos em periódicos ou anais internacionais.
A padronização — que deveria ser instrumento de qualidade técnica — é tratada como mero detalhe estético, quando, na verdade, é parte da base epistemológica da ciência.
Adoção nacional mandatória em editais públicos
Eventos financiados com recursos públicos poderiam ser obrigados a adotar um padrão único por área do conhecimento (por exemplo, via CAPES ou CNPq).
Divulgação ampliada da ABNT em universidades
Muitos estudantes e organizadores de eventos não têm domínio técnico das normas. Cursos de formação e materiais acessíveis seriam formas de ampliar o uso consciente.
Tecnologia a favor da normatização
Ferramentas como o Mendeley, Zotero e o MORE podem automatizar as referências segundo ABNT, mas ainda são subutilizadas. A promoção de seu uso pode diminuir o retrabalho.
A ABNT foi criada para normatizar, mas hoje é muitas vezes ignorada — não por falha técnica, mas por uma cultura institucional que prefere a reinvenção ao rigor. A falta de consenso não apenas desperdiça o tempo de pesquisadores, como compromete a integridade da produção científica nacional. Uma ciência sólida começa pelo cuidado com sua forma — e a forma também é conteúdo.