“Toma, pega duas e faz uma.” A frase, carregada de desprezo, foi dita por uma servidora pública durante a entrega de uniformes do programa Cuida Paraná, voltado a pessoas em situação de vulnerabilidade social. O episódio, presenciado por diversos alunos, expõe não apenas um caso de gordofobia explícita, mas uma série de erros administrativos, violências institucionais e negligências por parte da Secretaria da Justiça e Cidadania, responsável pelo projeto.
A cena se passou diante de dezenas de alunos: Roberta Justos, servidora da Secretaria da Justiça e Cidadania, entregava os uniformes aos participantes do curso promovido em parceria com o SENAI. Ao se deparar com três alunas gordas, proferiu a frase que chocou: “Pega duas e faz uma”. O comentário não só foi humilhante como revelou a falta de planejamento e empatia que marcam a execução do programa.
A coleta de numeração dos uniformes foi feita apenas um dia antes da entrega, contradizendo o que havia sido dito no evento de abertura. Tamanhos grandes sequer foram licitados, o que mostra o descaso com corpos fora do padrão, especialmente grave num programa que se propõe inclusivo e acolhedor para migrantes, pessoas em situação de rua e outras vulnerabilidades.
Uma das alunas afetadas relatou que não poderá frequentar as aulas sem o uniforme, e que, até o momento, não recebeu nenhuma alternativa concreta. O SENAI chegou a prometer um jaleco emprestado, mas o item ainda não foi entregue.
Além do episódio de gordofobia, a conduta da servidora Roberta Justos tem causado mal-estar generalizado entre alunos e docentes. No dia da entrega, visivelmente alterada, ela foi descrita como grosseira, arrogante e despreparada para lidar com o público. Ao ser questionada, reagia com irritação, recusava qualquer forma de feedback e chegou a ameaçar verbalmente um aluno.
A atitude autoritária de Roberta não se restringiu a uma única unidade. Em diferentes locais de realização do projeto, alunos relataram posturas semelhantes. Há ainda o registro de que ela teria dito a um dos coordenadores do SENAI: “Cala a boca, quem manda sou eu.”
O caso da entrega dos uniformes é apenas um entre muitos problemas que vêm marcando o Cuida Paraná. Alunos relatam a ausência de cronogramas, lista de materiais e falta de informações básicas sobre o andamento do curso. Nem mesmo os professores — que têm se mostrado comprometidos e esforçados — sabem exatamente o que será feito nas etapas seguintes.
Além disso, os lanches oferecidos — também licitados — são de baixa qualidade, o que gerou novas reclamações. A frustração é constante: alunos entraram no programa com o desejo de aprender e transformar suas vidas, mas se depararam com uma estrutura marcada por improviso, exclusão e negligência institucional.
O Cuida Paraná foi anunciado pelo Governo do Estado como uma iniciativa para capacitar migrantes e pessoas em situação de rua. São 128 alunos que compartilham o sonho de aprender para empreender, buscando qualificação profissional como ponte para o mercado de trabalho.
Porém, ao invés de inclusão, encontram barreiras veladas e explícitas. O despreparo da Secretaria da Justiça e Cidadania — e, em especial, de figuras como Roberta Justos — expõe como até mesmo projetos com potencial social podem reproduzir a violência institucional que deveriam combater.
É necessário que a Secretaria da Justiça e Cidadania se manifeste publicamente sobre as denúncias e tome medidas concretas de reparação. Os erros administrativos podem ser corrigidos com organização e planejamento. Mas os crimes de gordofobia, assédio moral e abuso de autoridade cometidos por Roberta Justos exigem responsabilização imediata.
Não é aceitável que, em um programa que deveria acolher, alunos sejam humilhados, silenciados e privados de condições básicas para participar. O Governo do Estado do Paraná deve responder: por que um projeto de inclusão virou palco de exclusão?
Enquanto isso, os alunos seguem firmes apenas por um motivo: o empenho dos professores e a esperança de que o aprendizado supere a dor causada por um sistema que ainda os enxerga com desprezo.
Caso foi denunciado no Ministério Público do Paraná e Ministério dos Direitos Humanos.