Nos últimos anos, grupos informais em redes sociais como Facebook, WhatsApp e Telegram têm se tornado pontos de encontro para a troca de esperma entre homens e casais ou mulheres que desejam engravidar, sem recorrer a clínicas especializadas. O que parecia ser uma solução acessível à reprodução assistida, porém, esconde um comércio ilegal de material biológico humano, que viola normas sanitárias, prejudica a saúde pública e coloca em risco a vida dos envolvidos.
Esses grupos oferecem o que pode ser caracterizado como “comércio ilegal de sêmen”, onde o esperma é oferecido de forma indiscriminada, muitas vezes com fins lucrativos. Além disso, muitos dos envolvidos fazem uso de métodos caseiros de inseminação, sem qualquer acompanhamento médico, o que aumenta exponencialmente os riscos para as mulheres e para a criança gerada a partir dessas práticas.
De acordo com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e o Conselho Federal de Medicina (CFM), a doação de material biológico humano, incluindo o sêmen, deve ser realizada dentro de normas estritas, que garantem a saúde tanto do doador quanto da receptora e da criança gerada. A doação informal, como a que ocorre nesses grupos, foge completamente da regulamentação e configura um crime de comércio ilegal de material biológico humano.
Esse tipo de prática clandestina não só contraria as normas da Anvisa, que estabelece regras claras para a coleta, armazenamento e distribuição de sêmen, como também ignora as normas do CFM sobre inseminação artificial, o que implica em sérios riscos à saúde pública. O comércio informal de sêmen, muitas vezes sem triagem médica, pode resultar na transmissão de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), como HIV, hepatite B e C, sífilis, e outras infecções graves.
Além disso, o risco de doenças genéticas não diagnosticadas também é um fator alarmante, já que o histórico de saúde do doador muitas vezes não é avaliado, colocando em risco a saúde da criança gerada.
A ausência de controle médico sobre o processo de doação informal de esperma aumenta consideravelmente os riscos para as mulheres que recorrem a essas práticas. A inseminação caseira feita sem orientação profissional pode levar a infecções uterinas, complicações durante a gestação e até a abortos espontâneos. Mulheres que se expõem a esse tipo de procedimento podem também contrair doenças que comprometam sua saúde a longo prazo.
O uso de métodos caseiros não regulamentados (como seringas ou até métodos sexuais) para a realização da inseminação também traz riscos de complicações físicas, como perfurações ou contaminações. Além disso, muitas dessas mulheres não possuem qualquer acompanhamento psicológico ou aconselhamento jurídico sobre as implicações da doação informal.
A prática de oferecer esperma em grupos informais com fins lucrativos ou por simples conveniência pode ser considerada um crime, conforme a Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro). De acordo com a legislação, o pai biológico tem a responsabilidade legal sobre a criança gerada, o que inclui a obrigação de pagar pensão alimentícia e responder por questões relacionadas à guarda e convivência. A doação realizada fora dos parâmetros legais pode resultar em longas batalhas judiciais, com consequências jurídicas inesperadas para as partes envolvidas.
Quando o comércio de esperma é feito com fins lucrativos, o doador e os intermediadores podem ser investigados por crime de tráfico de material biológico humano, o que configura violação das leis sanitárias e pode resultar em sanções penais, além de responsabilidades civis.
Embora as plataformas como Facebook, WhatsApp e Telegram não sejam responsáveis diretamente pelo conteúdo publicado pelos usuários, elas têm o dever de agir prontamente quando notificadas sobre conteúdos ilegais. Grupos que oferecem doação informal de esperma ou ensinam métodos caseiros de inseminação representam um risco à segurança das pessoas, e essas plataformas devem ser mais rigorosas na moderação e monitoramento de atividades ilegais.
De acordo com o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), as plataformas digitais têm a obrigação de remover conteúdos que violem as leis brasileiras assim que forem notificadas. Contudo, muitos desses grupos permanecem ativos por dias ou semanas após denúncias, permitindo que mais pessoas sejam expostas a esses riscos.
A reflexão que surge é: até que ponto as plataformas digitais devem ser responsabilizadas por não tomar ações rápidas e eficazes contra atividades ilegais em seus serviços? O vácuo regulatório atual cria um campo fértil para abusos, onde a internet, muitas vezes, age como uma verdadeira "terra sem lei".
O comércio ilegal de esperma e a promoção de práticas médicas sem respaldo científico são questões que exigem ação imediata das autoridades de saúde e justiça. A regulamentação mais rígida sobre a doação de sêmen e a fiscalização das plataformas digitais são passos essenciais para garantir a segurança das mulheres, crianças e de toda a sociedade.
Enquanto isso, é fundamental que as pessoas se conscientizem dos riscos envolvidos nesse tipo de prática informal e busquem alternativas legais e seguras para a reprodução assistida. A responsabilidade deve ser compartilhada entre governo, plataformas digitais e profissionais de saúde, para que possamos combater essas práticas perigosas e garantir que a saúde pública seja preservada.