Logo que cheguei em casa e recebi a mensagem do Júnior em nossa última conversa, já comecei a escrever essa reportagem. Aprendi com minha professora de telejornalismo e minha segunda mãe, Valdete da Graça, que, ao chegarmos de um acontecimento, devemos escrever o quanto antes, com a mente fresca. E assim o fiz.
Terminei o texto e até mesmo escrevi sobre os bastidores, compartilhando minha experiência dentro de um seminário pela primeira vez. Mas, três dias depois, estava a caminho de Apucarana, a 62,2 quilômetros de Maringá, onde iria dar aula de vídeo em uma agência de modelos. Durante o trajeto, em três ônibus para ir e três para voltar, meus pensamentos retornaram à reportagem que eu havia escrito e como ela tinha tudo a ver comigo. Quando li o livro No Olho da Rua, de Eliane Brum, ela afirma que para ela não fazia sentido sair igual de uma reportagem. Eu não entendia, pois isso nunca tinha acontecido comigo. No ônibus, com o fone ouvindo música, percebi que essa experiência realmente mexeu comigo. Um sentimento que vinha do estômago até a garganta. Os olhos quase se enchendo de lágrimas ao relembrar da minha conversa com o seminarista. E então entendi que escrevi uma reportagem sobre escolha. Sobre saber quem somos, de onde viemos e para onde vamos.
Então, em uma das paradas, peguei meu celular e, mesmo odiando escrever no aparelho, me sentei e comecei a reescrever os bastidores dessa que foi a primeira história que realmente mexeu comigo. Nesse momento, comecei a entender o que Eliane Brum queria dizer.
Júnior fez uma escolha e, talvez, ainda tenha muitas outras escolhas a fazer em sua trajetória em busca da fé. Eu, naquele momento, estava indo dar aula em uma agência de modelos. Lembrei-me então de que comecei nas passarelas e, em meus 17 anos de carreira, precisei fazer várias escolhas. Veio à mente um trecho final do filme O Diabo Veste Prada, onde a aspirante a jornalista Andy está com Miranda dentro do carro em Paris. Após descobrir que Miranda já sabia de toda a conspiração e que traíra seu melhor amigo, Miranda diz: "Eu vejo muito de mim em você", e Andy responde que não teria coragem de fazer o que ela fez com Nigel. Miranda então diz: "Mas você já fez, com Emily." Andy rebate, dizendo que não fez, que não teve escolha. E Miranda completa: "Você escolheu seguir em frente."
E assim é nossa vida, cheia de escolhas. Mesmo que seja seguir em frente. Essa é a história de um menino doce e meigo na escolha de sua vida. Ele ainda tem mais dois anos para fazer a escolha final: ser padre ou não ser. Mas, diferentemente das escolhas que fazemos ao longo da vida, a dele é quase um caminho sem volta. É uma escolha que mudará sua trajetória por completo. Será abençoada por Deus, mas solitária, uma vez que a fé é algo profundamente pessoal.
Quando o assunto é religião, também passei por diversas escolhas. Nasci católico, fiz minha primeira eucaristia, mas não crismei. Não comunguei com Deus, porque não achava que precisava de uma religião.
Em um momento de revolta, por tanto sofrer devido à minha sexualidade, por muitas vezes quis fazer pacto com o demônio. Cheguei inclusive a aprender como fazer. Frequentei grupos de bruxaria e alta magia. Comprei um livro de São Cipriano, capa preta, para o desespero da minha mãe. Mas foi por meio dele que aprendi que Deus existe, e que com Ele ninguém pode. Comprei então um livro chamado Cinema no Além. Quando cheguei em casa, minha mãe desdenhou: "Onde já se viu, cinema no além?!" Intensifiquei meus estudos. Entrei para a Rosa Cruz e, hoje, faço parte da ordem e frequento a casa espírita Bezerra de Menezes. Minha mãe virou espírita também, e meu pai nos apoia.
Durante a visita aos cômodos do seminário, senti presenças muito fortes e uma pressão grande atrás do pescoço, como normalmente sinto nas mesas mediúnicas. Contei para Júnior que não conseguiria morar em um lugar assim. Falei da minha doutrina e disse que, por ali ser um prédio velho, onde passaram muitas pessoas, não conseguiria ficar em paz. Ele respondeu dizendo: “Sim, aqui é um lugar velho, passaram muitas pessoas, realmente passaram.”
Ainda em nossa visita, tive que tirar algumas fotos, mas essa nunca foi minha habilidade. Levei uma câmera profissional, mas sabia que as fotos provavelmente não sairiam boas. Comecei a tirá-las, e como sabia que poderiam sair ruins, resolvi olhar as imagens. Quando vi, estavam todas borradas. Então, precisava tomar uma atitude para concluir meu trabalho. Logo pensei em tirar as fotos com o celular, mas com vergonha de contar a verdade, dei uma desculpa. Disse para ele que usaria as fotos em outra disciplina. Quando falei isso, estávamos andando e ele estava um pouco à frente. Então, ele virou para trás e, sorrindo, com um olhar de "aí meu Deus", disse: "Por mim tudo bem, desde que você seja honesto". Nesse momento, ri por dentro. Afinal, sei que, muitas vezes, os jornalistas somos vistos como "urubus", mas foi a primeira vez que alguém me disse isso diretamente. Espero que ele um dia reze pela minha alma.
Quando tive a ideia de escrever uma reportagem literária sobre um seminário, minha intenção era fazer uma imersão, passar o final de semana com os seminaristas, conhecer vários deles, dormir nas camas finas, tomar o mesmo café da manhã, almoçar, jantar, ver como é o dia a dia deles. Queria vivenciar e, quem sabe, me sentir mais próximo de Deus. Mas, claro, isso não aconteceu. Não pude ficar nem uma hora e conversei apenas com um. Vi os outros apenas pelos corredores.
Minha primeira etapa foi descobrir onde havia um seminário na cidade. Foi aí que tive minha primeira surpresa. Não imaginava que existiam tantos. Liguei para o primeiro que encontrei na pesquisa do Google. Falei com um senhor, cujo nome não me lembro, que me passou o nome do responsável, o padre Pedro, que atualmente está na Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Essa foi minha segunda surpresa. Quando criança, minha paróquia era a Santa Isabel de Portugal, onde o padre Pedro era um dos responsáveis. Foi com ele que fiz meu primeiro retiro de catequese e minha primeira eucaristia. Logo depois, a Paróquia Santa Isabel de Portugal foi dividida, e o padre Pedro ficou responsável pela metade dela, a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, onde ele ficou por muitos anos. Depois foi transferido e agora voltou recentemente. Incrivelmente, minha primeira fonte já era conhecida e estava bem perto de minha casa. Porém, durante o processo dessa reportagem, eu nunca o vi pessoalmente, apenas conversamos por telefone.
Liguei para a paróquia e falei com a secretária, que logo de cara quis saber sobre o assunto, algo que nem sequer cabia a ela. Então, me passou para o padre Pedro. Contei sobre a proposta e ele, de imediato, respondeu: "Impossível, os seminaristas vão para a casa dos familiares no final de semana", algo que, durante a entrevista com Júnior, entrou em contradição e me deixou sem entender a intenção do gestor do seminário. Foi então que ele me disse que eu poderia ir, primeiramente para conhecer os seminaristas e ver se algum deles gostaria de conceder uma entrevista. Pediu para que eu ligasse novamente em uma semana.
Passado esse prazo, minha vida estava super corrida. Entre um emprego em uma emissora de televisão, assessor de imprensa e cuidando da minha própria agência de comunicação, estava difícil ir ao seminário para saber se conseguiria algo e talvez voltar sem nada. Foi então que expliquei a situação e, pela primeira vez, mandei uma mensagem pelo WhatsApp.
Logo em seguida, recebi o contato do Júnior. Entrei em contato com ele também por mensagem e agendei para o mesmo dia, afinal, não poderia mais postergar, até porque ele também poderia desistir.
No dia da entrevista, minha grande companheira, minha mãe, estava viajando, então meu pai me levou de carro. Isso porque Júnior havia recomendado: "Aqui é um espaço aberto, então há dois cachorros que cuidam da propriedade. O ideal é que você venha de carro, se possível." E, como além de ovelha desgarrada eu sou considerada por muitos "a ovelha negra", não quis enfrentar os cães dos pastores de Deus.
No caminho para a entrevista, por acaso, passamos em frente à Paróquia Santa Isabel de Portugal. Fiquei surpreso com tanta mudança. Fazia tempo que não passava por lá. Vidraças novas, nova iluminação e a pracinha onde eu tanto brinquei quando criança havia virado um estacionamento. Tudo cercado por um novo portão, que antes não existia. Ali, percebi que a igreja cada vez mais constrói barreiras entre o fiel e a salvação. Talvez, por isso, tenha sido tão difícil realizar a reportagem como eu inicialmente imaginara. Mas, é claro, não podemos deixar de lado que a Igreja Católica é a maior instituição privada do mundo e, como todas as outras, precisa de regras, hierarquias e um certo proletariado.